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De acordo com o Estudo Epidemiológico Nacional, cerca de 11,3% da população portuguesa tem um problema relacionado com o álcool. Concretamente, 10,0% enquadram-se num abuso de álcool e 1,3% numa dependência de álcool. Isto representa mais de um milhão de pessoas em Portugal. Se nos restringirmos apenas aos casos mais graves, àqueles com dependência do álcool, mesmo assim, o número de pessoas afetadas é assustadoramente elevado, cerca de 130 mil pessoas.
Tão ou mais interessante do que os dados de prevalência destas perturbações relacionadas com o álcool, são outros resultados que foram também analisados:
- A idade média (mediana) de início situa-se entre os 22-23 anos
- 3 a 4,3% recorreram a tratamento no ano em que se inicia o problema
- O tempo médio de atraso do tratamento, ou seja, entre o início de abuso de álcool/dependência do álcool e o recurso a tratamento adequado, foi de 29 e 21 anos, respetivamente.
- À idade de 50 anos, 55% e 90% daqueles com abuso de álcool e dependência do álcool, respetivamente, foram submetidos a tratamento.
Quer isto dizer que as pessoas com perturbações relacionadas com o consumo de álcool levam mais de 20 anos a receber tratamento adequado e assim vivem, durante esse período de tempo, com o álcool e toda a problemática associada a este.
Como bem sabemos, os conflitos conjugais que o álcool gera e/ou exacerba, o ciúme patológico que tipicamente sucede em algumas das pessoas que abusam de álcool, a violência a que predispõe em muitas pessoas, a incapacidade que gera para o trabalho produtivo e o obstáculo que representa na ascensão profissional, além das consequências deletérias progressivas e muitas vezes irreversíveis sobre a saúde.
Muitas vezes também o álcool é utilizado como automedicação, para a pessoa se tranquilizar, relaxar, para ficar mais desinibida e facilitar a interação social, para esquecer, etc. Uma série de usos que justificam o consumo do álcool, mas cujas consequências acabam por ser mais graves do que os problemas iniciais que pretendiam resolver.
Para finalizar, de recordar que talvez mais assustador do que o consumo abusivo de álcool é o enorme atraso com que a pessoa recebe tratamento. Verdade é que aos 50 anos uma grande maioria acaba por receber tratamento, mas tal acontece após uma destruição pessoal e familiar total ou parcial.
Imaginemos a quantidade de felicidade, de sorrisos, de experiências positivas e de vidas com sentido que teriam sido salvas se precocemente a pessoa que consome álcool de forma abusiva reconhecesse estar perante um problema, procurasse ajuda para o enfrentar e recebesse um tratamento adequado e eficaz.
Nuno Rodrigues Silva
Médico Psiquiatra